Os reembolsos de despesas devem ser tributados?

Essa é uma dúvida muito comum, mas que ainda gera muitas incertezas pelo fato de essa prática, apesar de bastante utilizada no mercado, ainda ser alvo de constantes questionamentos fiscais.

Para entender um pouco mais sobre essa questão, confira o artigo que preparamos a seguir!

Como funcionam os reembolsos de despesas?

Para entendermos como funcionam os reembolsos de despesas e quando eles devem ser tributados, é importante conhecermos, primeiro, o conceito de “reembolso de despesas”. Depois disso, teremos base para entender os seus efeitos tributários.

Normalmente, os reembolsos de despesas ocorrem em duas situações:

  • quando uma empresa, buscando reduzir custos administrativos internos, realiza gastos em nome de outras empresas do mesmo grupo e, posteriormente, obtém o reembolso por esses custos mediante a emissão de uma Nota de Débito; ou
  • quando uma empresa assume gastos de seus clientes e, posteriormente, obtém o reembolso junto ao cliente. Exemplo: um escritório de advocacia paga os custos processuais do cliente e depois recebe o reembolso.

Quando os reembolsos de despesas são legítimos?

Compreender quando os reembolsos de despesas são válidos é essencial para entendermos o posicionamento do fisco e quando a tributação deve ocorrer.

O reembolso é legítimo quando uma empresa (ou prestadora do serviço) desembolsa determinados valores que, na realidade, são despesas de seu cliente. Dessa maneira, posteriormente, o prestador do serviço busca a mera recomposição patrimonial desses valores junto ao cliente. Essa é uma prática comum na contratação de serviços profissionais.

A situação é completamente diferente de quando o prestador do serviço cobra de seus clientes determinados “reembolsos” de custos e despesas incorridos no curso normal do processo de prestação do serviço. Esses “reembolsos”, na realidade, representam receita de prestação de serviços.

Por exemplo, se o prestador de serviço incorre em despesa de telefonia para prestar seus serviços aos clientes, a despesa de telefonia é despesa própria do prestador do serviços e, portanto, se tais valores são cobrados de seus cliente, essa parcela recebida é, na prática, uma receita. Ou seja, se por um lado o prestador do serviço incorre em despesas (ex: telefonia), por outro lado aufere receitas.

Em compensação, se o prestador do serviço paga uma taxa em nome de seu cliente, obviamente esse custo não é uma despesa própria, mas de terceiros. Nesse caso, o prestador do serviço age como mero intermediário na operação, não incorrendo em despesa e nem auferindo receita.

A tributação do reembolso de despesas também causa polêmicas pois, em alguns casos, é mais difícil determinar quem está incorrendo na despesa.

Por exemplo, se um consultor prestará seus serviços em outro estado e, para isso, precisa de transporte aéreo e hospedagem, tais necessidades poderiam ser providenciadas tanto pelo prestador do serviço quanto pelo cliente.

Por esse motivo, é muito importante verificar o que estipula o contrato de prestação de serviços, conforme veremos mais adiante.

Qual é o entendimento do fisco?

Por se tratar de um assunto com certo grau de subjetividade, o fisco muitas vezes autua a empresa que recebe reembolso de despesas, colocando a empresa em uma situação delicada, uma vez que, para recorrer da autuação, é necessário juntar toda a documentação suporte e arcar com o ônus de se defender na esfera administrativa e judicial.

O entendimento do fisco varia de acordo com o regime tributário adotado pela empresa, como podemos ver a seguir:

Empresas do Lucro Real

Solução de Consulta nº 034/2007
EMENTA: ESTIMATIVA. BASE DE CÁLCULO.

As demais receitas não compreendidas no conceito de receita bruta, tais como as financeiras ou o reembolso de despesas, integrarão, pelo todo, o valor da base de cálculo do imposto mensal por estimativa.

Solução de Consulta n° 077/2012
EMENTA: REGIME NÃO CUMULATIVO. REEMBOLSO DE DESPESAS. INCIDÊNCIA.

Está sujeito à tributação pela Cofins o reembolso de despesas relativas a viagens, transporte etc. necessárias à execução dos serviços prestados pelo contribuinte e que, por determinação contratual, devam ser ressarcidas a ele pelos tomadores dos referidos serviços.

Empresas do Lucro Presumido

Solução de Consulta nº 321/2011
ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA — IRPJ

Para fins de apuração da base de cálculo do imposto sobre a renda das empresas tributadas pelo lucro presumido, integra a receita bruta o valor percebido a título de reembolso de despesas.

Solução de Consulta nº 159/2012
EMENTA: BASE DE CÁLCULO. REEMBOLSO DE DESPESA.

A base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep no regime cumulativo é o valor do faturamento, entendido como a receita bruta conquistada pela pessoa jurídica, observadas as exclusões permitidas em lei. Desse modo, os valores recebidos de clientes, referentes a reembolso de despesas incorridas pela pessoa jurídica visando à prestação dos serviços que constituem seu objeto, compõem a receita bruta para fins de apuração da base de cálculo da contribuição, uma vez que não há nenhum dispositivo legal permitindo sua exclusão.

Empresas do Simples Nacional

Solução de Consulta nº 72/2020
EMENTA: RECEITA BRUTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. PREÇO DO SERVIÇO. REEMBOLSO DE DESPESAS.
No âmbito do Simples Nacional, a receita bruta da atividade de prestação de serviços compreende o preço do serviço prestado, não importando a denominação que se dê a esse preço ou a parcelas desse preço. Desse modo, custos e despesas faturados ao tomador do serviço devem ser computados como parte do preço de venda e, portanto, integrantes da receita bruta.

Na esfera municipal, podemos exemplificar o entendimento do fisco tomando por base o Regulamento do ISS/RJ:

“Art. 10. (…)
1º – Considera-se preço tudo que for cobrado em virtude da prestação do serviço, em dinheiro, bens, serviços ou direitos, seja na conta ou não, inclusive a título de reembolso, reajustamento, doação, contribuição, patrocínio ou dispêndio de qualquer natureza, sem prejuízo do disposto neste Capítulo e no Capítulo IX deste Título.”

Em todos os casos, cabe ao contribuinte provar que ele foi meramente ressarcido por gastos que foram realizados em nome de terceiros. Por isso, a assessoria de um escritório de contabilidade é tão importante, como veremos adiante.

Quais são os argumentos a favor dos contribuintes?

Tributar todas as despesas incorridas por conta e ordem do cliente, sem sombra de dúvidas, resultará em um grande aumento dos preços a serem praticados pelo contribuinte, o que afetará negativamente sua competitividade no mercado. Afinal, inúmeras empresas utilizam as Notas de Débito.

Além disso, várias empresas públicas, ao tomarem serviços de empresas privadas, expressamente aceitam, em seus editais, a emissão de Notas de Débito para que o prestador de serviços seja ressarcido das “despesas reembolsáveis” incorridas por conta da prestação dos serviços contratados.

Nessa linha de raciocínio é que, a nosso ver, se observados os critérios e cuidados que tratamos ao final deste artigo, a pretensão fiscal de tributar os reembolsos de despesas, seja no âmbito federal, seja no âmbito municipal, é passível de ser derrubada inicialmente na própria esfera administrativa e, em sendo necessário, posteriormente, na esfera judicial, conforme decisão abaixo exemplificada:

Decisão CARF nº 19-318/2001
FATO GERADOR. REEMBOLSO DE DESPESAS.
EXCLUSÃO. A amplitude da base de cálculo da Cofins, dada pela Lei nº 9.718/98, não alcança os valores escriturados a título de reembolso de despesas, porquanto estes não representam ingresso de receita nova.

Além disso, um importante elemento de defesa dos contribuintes é a própria definição de receita, que é bem distante do conceito do que chamamos de reembolso de despesas, conforme nos ensina Bernardo Ribeiro de Moraes:

“O conceito de receita acha-se relacionado ao patrimônio da pessoa. Quem aufere receita recebe um valor que vem alterar o seu patrimônio e sua riqueza. Receita, do latim ‘recepta’, é o vocábulo que designa recebimento, valores recebidos. Receita é o vocábulo que designa o conjunto ou a soma de valores que ingressam no patrimônio de determinada pessoa.

Podemos definir receita como toda entrada de valores que, integrando-se ao patrimônio da pessoa (física ou jurídica, pública ou privada), sem quaisquer reservas ou condições, venha acrescer o seu vulto como elemento novo e positivo.”

Essa definição, inclusive, é reforçada pelo Pronunciamento Conceitual Básico emitido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), que conceitua receita como sendo a “entrada de recursos, aumento de ativos ou diminuição de passivos que resultam em aumentos do patrimônio líquido”.

Por outro lado, no legítimo reembolso de despesas adiantadas pelo contribuinte por conta e ordem de seu cliente, não há que se falar em acréscimo patrimonial, mas tão somente recomposição patrimonial, conforme a lição de Eduardo Bottallo:

“(…) os contribuintes (…) têm o direito de não considerar, como receitas próprias, valores que apenas transitam por seus livros fiscais, sem representar, entretanto, acréscimo patrimonial. Tal é o caso, v. g., dos montantes a eles repassados para satisfação de despesas incorridas por conta e ordem de terceiros ou para pagamento, aos efetivos prestadores, por serviços por eles apenas intermediados.”

Mas como argumentar diante das tributações municipais? Para entendermos esses casos, exemplificamos com as seguintes decisões:

Recurso Especial nº 618.772/RS
EMENTA TRIBUTÁRIO. ISS. BASE DE CÁLCULO. PREÇO DO SERVIÇO. DESPESAS REFERENTES A VALORES QUE SERÃO REPASSADOS A TERCEIRO E POSTERIORMENTE REEMBOLSADOS. NÃO INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO.
A base de cálculo do ISS é o preço do serviço, não sendo possível incluir nesse valor importâncias que não serão revertidas para o prestador, mas simplesmente repassadas a terceiros, mediante posterior reembolso.

Recurso Especial nº 788.594/MG
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. BASE DE CÁLCULO. REEMBOLSO DE DESPESAS DE VIAGEM, ALIMENTAÇÃO E ESTADA DE EMPREGADOS QUANDO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM OUTRA LOCALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DO ISSQN.
A base de cálculo do ISS é o preço do serviço, consoante disposto no art. 9º, caput, do Decreto-Lei no 406/68. Consequentemente, as despesas realizadas com viagens, alimentação e estada de funcionários, para prestação do serviço em localidade diversa do estabelecimento do prestador, ostentam natureza indenizatória em virtude do repasse ao contratante para posterior reembolso, não integrando a remuneração pelo serviço prestado, porquanto não realizadas em favor de quem as efetuou.

Qual é a importância de contar com um escritório de contabilidade?

Como mostramos, apesar de existirem argumentos jurídicos suficientes para afastar a incidência de tributação sobre valores recebidos legitimamente a título de reembolso de despesas, não podemos descartar a possibilidade de autuação por parte do fisco, cabendo ao contribuinte se defender na esfera administrativa e, eventualmente, judicial. Embora o tema tenha evoluído bastante na jurisprudência, as autuações ainda persistem. Por isso, é tão importante que o contribuinte prove que está apenas ressarcindo os custos e despesas de terceiros.

E é justamente nessa prova que ocorrem a maioria das decisões contrárias às empresas, mesmo que elas tenham pedido o reembolso de maneira válida. Isso se dá porque, em uma boa parte dos casos, a documentação não comprova que a despesa era de um terceiro. Nos casos das empresas que pertencem a um mesmo grupo econômico, é comum que o ressarcimento não tenha uma correlação lógica com o serviço prestado ou com o que foi reembolsado.

Quais são os cuidados essenciais ao fazer o reembolso de despesas?

Diante dos riscos de autuação, destacamos alguns cuidados essenciais na realização de qualquer procedimento de reembolso de despesas:

  1. O reembolso das despesas deve estar expressamente previsto nos contratos assinados entre o contribuinte e seus clientes;
  2. O reembolso deve ocorrer pelo valor efetivamente desembolsado pela empresa – nunca por um valor superior;
  3. As despesas devem referir-se a gastos necessários, usuais e comprovados, nos termos do art. 299 do RIR/99;
  4. Os documentos comprobatórios dos valores reembolsados devem ser guardados pelo prazo de 5 anos;
  5. As despesas não devem tentar disfarçar efetivos custos da prestação de serviços do contribuinte, mas sim se limitarem a valores necessários à conclusão do objeto contratado por ele adiantados por conta e ordem do tomador dos seus serviços;
  6. As despesas que puderem ser assumidas e pagas diretamente pelo cliente do contribuinte ao fornecedor assim deve ser feito, por precaução;
  7. Deve haver razoabilidade entre a proporção do valor do preço dos serviços faturado pelo contribuinte e das despesas reembolsáveis para tanto; (Exemplo, a contrario sensu, seria inadmissível que o valor das despesas a serem reembolsadas fosse superior ao valor do próprio preço do serviço prestado)
  8. A contabilização dos desembolsos financeiros de despesas incorridas em nome de terceiros bem como o seu respectivo ressarcimento por parte do cliente jamais deve transitar por “contas de resultado”, devendo a contabilização se dar sempre em “contas patrimoniais”.

Conclusão

Como você pôde perceber, o procedimento de reembolso de despesa requer muito cuidado por parte das empresas. Afinal, não basta que a operação seja legítima: é necessário manter a guarda de toda a documentação comprobatória em caso de eventual fiscalização.

Nesse sentido, reforçamos a importância de obter um assessoramento adequado do seu escritório de contabilidade. Afinal, com a documentação bem organizada e com as transações corretamente contabilizadas, dificilmente a sua empresa será autuada. E vale lembrar que, em caso de autuação, incidirá os encargos de ofício e moratórios.

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