Com o advento da Escrituração Contábil Digital (ECD), que nada mais é do que a versão digital do Livro Diário e Livro Razão, as empresas mercantis passaram a estar dispensadas do arquivamento do Livro Diário perante a Junta Comercial, bastando que a empresa transmita a ECD no ambiente eletrônico do SPED.
Por outro lado, tendo em vista que as sociedades de advogadas são regidas pelo Estatuto da OAB, surge a seguinte questão: As sociedades de advogados estão obrigadas a arquivar o Livro Diário na OAB?
Outra dúvida é: As sociedades de advogados estão obrigadas a entregar a ECD?
Se você tem essas dúvidas, acompanhe este post até o final!
Aspectos Societários
A legislação que estabelece os critérios de obrigatoriedade de manutenção de escrituração contábil, que consiste no art. 1.179 do Código Civil e no Decreto-Lei nº 486/1969, só se aplica aos empresários e sociedades empresárias, ou seja, aquelas sujeitas ao registro na Junta Comercial, de forma que as sociedades de advogados não se inserem nesse conceito, já que o art. 16 do Estatuto da OAB proíbe o funcionamento das sociedades que apresentem característica mercantil.
De acordo com o art. 9º do Provimento OAB nº 112/2006, os livros contábeis que venham a ser adotados pela sociedade de advogados, para que tenham eficácia perante terceiros, podem ser registrados e autenticados no Conselho Seccional da OAB competente.
Neste sentido, um estudo realizado pela Comissão da Sociedade de Advogados da OAB/SP concluiu que o registro do Livro Diário perante a OAB é facultativo para as sociedades de advogados, a menos que a sociedade pretenda que os livros contábeis tenham eficácia perante terceiros, hipótese na qual o registro se faz necessário.
Dessa forma, é importante avaliarmos a questão da “eficácia perante terceiros” sob a ótica tributária, já que um desses “terceiros” é o próprio fisco, que teria legítimo interesse em verificar a escrituração contábil do contribuinte para fins tributários, como veremos mais adiante.
Portanto, podemos concluir até aqui que as sociedades de advogados não estão obrigadas à manutenção da escrituração contábil por força da legislação comercial ou societária. No entanto, é possível que a obrigatoriedade decorra da legislação tributária.
Aspectos Tributários
O art. 3º da Instrução Normativa nº 2003/2021, determina que estão obrigadas à entrega da ECD as pessoas jurídicas que estejam obrigadas a manter escrituração contábil nos termos da legislação comercial.
Como já vimos, se observarmos isoladamente a “legislação comercial”, chegaríamos a conclusão de que as sociedades da advogados não estão obrigadas à manutenção da escrituração contábil e, portanto, estariam dispensadas da entrega da ECD.
Não obstante, é importante levarmos em consideração os critérios de obrigatoriedade da manutenção de escrituração contábil para fins fiscais, principalmente quando a sociedade distribui lucro isento aos seus sócios.
Segundo o art. 238 da Instrução Normativa nº 1700/2017, não estão sujeitas ao imposto de renda as distribuições de lucro realizadas pelas sociedades optantes pelo Lucro Presumido, desde que demonstrada a existência de lucros apurados com base na escrituração contábil, feita com observância da lei comercial.
Em se tratando de sociedades optantes pelo Lucro Real, o art. 14 da Lei nº 8.218/1991 também determina a obrigatoriedade de manutenção da escrituração contábil, feita com observância da lei comercial.
Portanto, verifica-se que as sociedades de advogados optantes pelo Lucro Real e aquelas optantes pelo Lucro Presumido que distribuírem lucros isentos acima dos limites de presunção previstos em lei, estão obrigadas à manutenção da escrituração contábil por força da legislação tributária.
Ou seja, considerando que a entrega da ECD é obrigatória para as pessoas jurídicas obrigadas a manter escrituração contábil nos termos da legislação comercial, uma possível linha de raciocínio seria no sentido de que as sociedades de advogados não estariam obrigadas à manutenção de escrituração contábil por força da legislação comercial, uma vez que a obrigatoriedade decorre, eventualmente, da legislação tributária e, portanto, as sociedades de advogados não estariam contempladas nos critérios de obrigatoriedade da ECD.
Outra linha de raciocínio, mais conservadora, é no sentido de que as sociedades de advogados que estejam obrigadas à manutenção de escrituração contábil por força da legislação tributária, também estariam obrigadas à entrega da ECD, independentemente de essa obrigatoriedade decorrer da legislação comercial ou da legislação tributária.
É importante notar que o art. 7º da Instrução Normativa nº 2003/2021 prevê que a autenticação dos livros contábeis que é exigível para fins tributários poderá se dar pela apresentação da ECD, sendo que o recibo de entrega emitido pelo SPED servirá de comprovação de autenticação, dispensada qualquer outra forma de autenticação.
Ou seja, a entrega da ECD seguramente cumpre a exigência de manutenção de escrituração contábil para fins tributários. Por outro lado, não temos como assegurar que, na visão do fisco, o Livro Diário físico (autenticado na OAB) cumpra as formalidades para fins tributários.
Conclusão
Considerando todo o exposto acima, voltemos às dúvidas iniciais:
As sociedades de advogados estão obrigadas a arquivar o Livro Diário na OAB?
Não, o arquivamento do Livro Diário na OAB é facultativo. Não obstante, o arquivamento do Livro Diário na OAB é uma das formas de tornar a escrituração contábil eficaz perante terceiros, assim como a entrega da ECD também cumpre essa finalidade.
As sociedades de advogados estão obrigadas a entregar a ECD?
Apesar de existir argumentação em ambos os sentidos, entendemos que as sociedades de advogados que estiverem obrigadas a manter escrituração contábil por força da legislação tributária, devem entregar a ECD.
Independentemente da discussão teórica que apresentamos nesse post, recomendamos que todas as sociedades de advogados mantenham escrituração contábil para auxiliar na gestão do negócio.
Nesse contexto, é muito importante contar com a assessoria de um escritório de contabilidade especializado no atendimento a escritórios de advocacia.